Começo por dizer que a tal "data Fifa" me impediu de ver mais um jogo no Olimpico de Roma. Imaginei que um final de semana por lá seria o bastante para garantir um jogo da Roma ou da Lazio, mas não contava com os jogos das eliminatórias para a Eurocopa. A Italia enfrentou Ilhas Faroe (fora) em uma quinta e Eslovênia (em Firenze) na terça seguinte, de tal forma que o final de semana ficou órfão. E mesmo este jogo em Firenze eu não pude assistir porque estava em Napoli - cheguei à Toscana só depois.
Em sendo assim, restou o segundo final de semana na Italia para ver um jogo, mas aí a tabela é que não foi muito promissora. Estava então a caminho de Veneza e o que sobrou foi o jogo entre os dois clubes que são provavelmente os mais irrelevantes entre os 20 que disputam hoje a Série A: Chievo Verona e Novara. São dois times pequenos do Norte, que, para efeito de comparação com o nosso universo, estão no nível de, sei lá, Juventude e Ipatinga. Mas era o que estava ao meu alcance e me permitiu conhecer ao menos mais um estádio italiano, o Bentegodi de Verona (uma das sedes da Copa/1990).
Uma panorâmica do Bentegodi de Verona (acima) e o ingresso (abaixo)
Com capacidade para 40 mil torcedores, o campo é utilizado pelos dois clubes da cidade, o tradicional e popular Verona, uma espécie de Santa Cruz local, pois há tempos na terceira divisão; e o Chievo Verona, um emergente que guarda certa semelhança com aquela mentira azul do ABC. É um belo estádio, um tanto mal cuidado, mas bem ao estilo das canchas italianas: grande, com setores superior e inferior e com arquibancada distante do campo.
O jogo aconteceu às 15h de um domingo (10h aqui). Verona é uma cidade bastante turística (tem um anfiteatro romano semelhante ao Coliseu e é a terra de Romeu e Julieta), e o estádio fica na periferia. De carro, foi fácil comprar ingresso: bastou ir ao estádio naquela manhã e, sem filas, adquirir o bilhete. 18 euros (cerca de R$ 42) pela Curva Sud, o setor mais barato - havia ainda ingressos de 36 e 60 euros. Teria sido fácil comprar na hora do jogo também: foram apenas 3.500 pagantes (embora parecesse haver o dobro).
Quanto às torcidas, nada empolgante. A do Chievo Verona é composta em sua maioria por homens de meia idade. Havia também muitos idosos (algumas senhorinhas até). Ultras? Bom, havia um pequeno grupo, de 100 pessoas no máximo. O capo era um moleque de 20 e poucos anos e parecia estar naquela posição mais por falta de opção. Em se tratando de uma cidade como Verona, aquilo era o máximo de transgressão de que ele seria capaz. E ele parecia nem ter muita ascendência sobre o grupo, que se limitava a cantar músicas entoadas por todas as outras torcidas italianas, gritos de "Forza Chievo" e um outro xingamento a determinado jogador do Novara. Nem sequer havia ofensas à torcida visitante, um grupo de não mais de três centenas de pessoas, que viajou cerca de 300km da Lombardia até o Veneto.
O jogo foi bem ruim. O Chievo abriu 2 a 0, um gol em cada tempo, e, depois de ter um jogador expulso, permitiu o empate do Novara. Ao final, vaias tímidas.
Nada espetacular, mas é bom registrar que, antes de Verona, cumprindo a minha rotina de ter os estádios como ponto turístico de cada cidade (não entendo como os guias de turismo ignoram isso), dei um jeito de conhecer outros três estádios: o San Paolo de Napoli, o Artemio Franchi de Siena e o Renato Dall'Ara de Bologna. Nenhum deles estava aberto ao público ou tinha visita guiada. Em Napoli, um funcionário permitiu a entrada por um portão lateral para tirar foto. Em Siena, isso não foi possível, mas deu para ver a cancha de uma piazza um pouco acima. Em Bologna, os portões estavam abertos para o clube social e eu só tive que pular uma grade para chegar à arquibancada. Em Modena, tudo fechado.
O San Paolo de Napoli, maior estádio do Sul da Italia
O Dall'Ara de Bologna também recebeu jogos da Copa de 90
Direto da Curva Giacomo Bulgarelli
Já fora da Italia, vale registrar a visita a dois estádios bastante significativos para explicar o tal "futebol moderno". Começando por Heysel, em Bruxelas, palco de uma tragédia que deixou 39 mortos na final da Copa dos Campeões da Europa de 1985 (detalhes aqui). É inegável que tal ocorrência mudou o tratamento concedido pelas autoridades ao torcedor de futebol. Os belgas parecem querer não se lembrar disso; a única referência ao episódio é uma placa de bronze na fachada do estádio com os nomes das 39 vítimas.
O estádio Rei Baudouin (ou Koning Boudewijn Stadion) passou por uma reforma que o transformou em algo totalmente diferente do que era. Hoje pouco utilizado (o Anderlecht, maior clube do país, tem sua própria casa), é mais uma arena multiuso que propriamente um estádio de futebol. Fica na periferia de Bruxelas e, a exemplo de quase todos os campos de grandes cidades europeias - Roma e Barcelona são exceções -, tem uma estação de Metrô ao lado.
A imponente fachada de Heysel (acima) e a placa com os nomes de todos os mortos na tragédia que mudou a história do futebol no mundo (abaixo)
Mudando de país, outra cancha importante, também com Metrô ao lado: Amsterdam ArenA, casa do Ajax. Quem está na faixa dos 30 anos certamente vai se lembrar do estardalhaço da nossa imprensa esportiva por ocasião da inauguração desta arena, em 1996, tida então como a mais moderna do mundo. Era uma prévia do "padrão Fifa" que hoje assola os estádios do mundo.
A visita guiada (12 euros - ou grátis para quem tem o Amsterdam Card) é semelhante à de outros campos europeus: gramado, sala de imprensa, arquibancada, história do estádio, o escambau. Faltaram só a desnecessária passagem pelos vestiários e a visita ao museu, que, para meu azar, passava por reformas e seria reaberto três dias depois. Ficou pendente.
Sobre o estádio: é belíssimo e tem a vantagem de cadeiras retráteis, não atrapalhando, portanto, quem deseja ver o jogo em pé. Chama atenção pelo grau de inclinação do setor superior (muito parecido com o do Santiago Bernabeu), permitindo uma visão privilegiada de qualquer lugar, e pela solução inteligente para os telões, visíveis para a totalidade do público e sem atrapalhar ninguém. Merece destaque também a cobertura que abre e fecha de acordo com a necessidade.
Mais um ponto importante: o Ajax oferece para seus torcedores o ArenA Card, um cartão pré-pago que permite ao torcedor comprar alimentos e bebidas sem a necessidade de usar dinheiro.
Amsterdam ArenA, a casa do Ajax
Para finalizar este já longo post, o segundo jogo da viagem: Paris Saint Germain x Salzburgo pela Liga Europa, a Copa Sul-Americana de lá. Eu bem sei que os clubes envolvidos não são lá grandes atrativos, mas a França não apresenta nada muito melhor - a não ser em Marseille, bem longe de Paris.
Mas é preciso começar pelo começo. Cheguei a Paris em uma terça-feira e o jogo era na quinta. Não me animei muito, mas era a única opção. Comprei ingresso pela internet, no site do PSG. Foi só fazer um rápido cadastro e usar o cartão de crédito. O ingresso mais barato, a 25 euros, era de um setor central - as curvas não estavam disponíveis. Preferi garantir assim mesmo e retirei o ingresso na Fnac - poderia ser em qualquer uma das muitas lojas da rede em Paris.
Para chegar ao estádio, Metrô - como tudo mais. Muitos torcedores indo para lá, e então é o caso de dizer que a torcida do PSG é um retrato da população local: franceses típicos (pensem naquele arquétipo entojado) misturados a imigrantes árabes e africanos.
O estádio é bem agradável. Meu lugar era central, em um setor superior, com visão privilegiada de toda a arquibancada. Era preciso seguir toda aquela pataquada de lugares numerados, e o povo realmente leva o negócio a sério. Tem até monitora para indicar o lugar aos menos habituados - e eu vi um nego dando gorjeta para a moça.
Com capacidade para 45 mil torcedores, o estádio recebeu pouco mais de 23 mil. Era a primeira rodada da competição europeia, e o adversário não era nada empolgante - o austríaco Salzburgo é mais conhecido por ter sido comprado pela Red Bull, que estuprou o símbolo do time com a inserção da sua logomarca. Uma aberração.
Havia não mais do que 200 visitantes, em um canto próximo aos "ultras" do PSG. Coloco entre aspas porque não pareciam ser ultras. Era uma torcida bem fraca, com uma única música, repetida à exaustão. E uma única faixa, no setor superior, os apresentava: Paris Saint-Germain.
O time da casa tem um ataque muito forte. O argentino Pastore fez o que quis com os zagueiros austríacos. Havia ainda mais um bom atacante e o tal de Nenê - que está jogando muito. O mesmo se aplica ao tal zagueiro, que ganhou todas de cabeça. O placar, 3-1, não reflete o que foi o jogo. O PSG poderia ter enfiado seis ou sete gols, mas pecou pelo preciosismo. Perdeu gol atrás de gol, ficou só no 3 a 0 e, em uma falha do lateral-direito, tomou um gol.
Panorâmica do Parc des Princes
A vista do lado de fora, já depois do jogo
Parece ser um ingresso de qualquer coisa, menos de um jogo de futebol
Ao final de tudo, o balanço é razoável. Não tive o jogo de Roma, dei azar em outros lugares e, além de visitas a campos importantes, fico com o saldo de mais dois novos estádios para o currículo. Não deixa de ser alguma coisa. Que venham as próximas férias!