É possível analisar o clássico desta tarde no estádio de Itaquera de maneiras muito distintas. Vou apresentar duas:
-Você pode, por exemplo, chegar em casa depois do jogo e ligar na TV Gazeta para presenciar as múmias do Mesa Redonda quebrando todos os recordes de reacionarismo, desinformação e preguiça. Barrigas robustas à mostra, Prado, Nogueira e Lang destilarão (como efetivamente destilaram) toda uma sorte de impropérios, mentiras e falácias, dignas de débeis figuras cujas bundas carcomidas há muito não sabem o que é uma arquibancada (ou uma cadeira, vá lá).
-Você pode acompanhar a 'cobertura' informal dos que lá estivemos ou, preferencialmente, do notável Gabriel Uchida, o fotojornalista responsável pelo FotoTorcida, este memorial da resistência da arquibancada. É do Uchida, que acompanhou nossa caravana até território estrangeiro, a foto, em primeira mão, que abre este post.
A meu ver, a opção por uma ou por outra é uma questão ou de caráter ou de inteligência. Ou as duas coisas, o que me parece mais provável.
Isso posto, gostaria de dizer o seguinte:
A tabela deste Campeonato Brasileiro foi divulgada em 7 de fevereiro. Era sabido, portanto, que o estádio de Itaquera receberia um clássico entre SCCP e Palmeiras no dia 27 de julho. Entre o anúncio e o jogo, quase seis meses se passaram. Seis meses para que as autoridades avaliassem a logística adequada para transportar uma torcida visitante até o novo campo. Seis meses!
O que fez o 2º Batalhão de Choque da Polícia Militar? Simples: omitiu-se. Nada fez do ponto de vista programático, a não ser agendar uma reunião entre as duas torcidas e as demais partes envolvidas na sexta-feira que antecedeu o duelo. Ou seja: seis meses se passaram e a discussão ficou apenas para a véspera.
Daí então que os bravos, valorosos e destemidos homens do 2º BP Choque
A imposição das autoridades pode ser conferida neste muito elucidativo vídeo do GloboEsporte. Veremos, mais adiante, como todos os argumentos (da PM e da CPTM, mais especificamente) caíram por terra.
Antes disso, no entanto, eu, jornalista que sou, gostaria de fazer o papel que, por desconhecimento de causa, não foi cumprido por nenhum de meus colegas da mídia esportiva. Pergunta simples: "Caro capitão, onde haveria espaço para estacionar os 50 ônibus?"
Estava em gestação um cenário que poderia muito bem provocar a ruptura que agradaria a tantos dos personagens acima citados: clássicos com torcida única. Dá menos trabalho, não é?
Coube à Mancha Verde, no entanto, a tarefa de contestar a decisão do Choque. A posição da organizada era a única viável do ponto de vista logística para a segurança de todos os envolvidos: trem expresso da Barra Funda até a estação Dom Bosco e caminhada com escolta nos 4 km até o estádio.
Ainda que com certa histeria, a imprensa cobriu bem o embate da última sexta - e contribuiu para a reversão do quadro. Ficou para a Mancha, em um primeiro momento, a imagem de intransigência - reforçada pela declaração de alguns bandidos bem graúdos. Se a reputação habitual costuma ser pior que esta, dos males o menor. Fica a mensagem, lá atrás e agora ainda mais, de que a entidade Mancha Verde se arriscou, quase em um ato de sacrifício, para cumprir a sua missão histórica de salvaguardar a torcida do Palmeiras.
Porque se o esquema imposto pelas autoridades poderia levar a uma catástrofe anunciada, eis que a organização da Mancha Verde garantiu que saíssemos, quase 2.000, da Barra Funda, ainda na manhã de domingo, para chegar em paz ao estádio de Itaquera - o mesmo acontecendo na volta.
Coube à CPTM (e possivelmente à PM, em acordo posterior) uma valiosa contribuição no sentido de garantir que os trens fizessem os percursos de ida e volta entre Barra Funda e Dom Bosco sem qualquer parada. Do início ao fim, sem baldeação, sem encontros com adversários, sem quaisquer transtornos.
Entre a estação Dom Bosco e o Setor Sul do estádio, funcionou bem a escolta da PM. Como se estivéssemos na Sumaré, entre o Palestra e o Pacaembu, seguimos tranquilamente por entre ruas tão desconhecidas quanto vazias. Se tanto, nossas baixas civis se resumem a contusões aqui e acolá dos vitimados pelas ladeiras de Itaquera.
Chegamos em paz. Saímos em paz. Voltamos em paz.
É bem verdade que foram 12 horas na rua - e apenas duas delas foram dedicadas ao jogo -, mas se este é o preço a se pagar para garantir clássicos como este com as duas torcidas em segurança, então podem contar com a gente.
A Mancha Verde, tão em baixa com a rasteira opinião pública, fez o seu papel; estão de parabéns todos os responsáveis pela estratégia adotada e pela execução precisa de toda a programação neste domingo. É bem provável que a logística de hoje seja adotada em todos os próximos clássicos (envolvendo também os outros grandes) no estádio de Itaquera. Basta que as autoridades responsáveis tenham boa vontade e disposição.
###
Constatações:
_Sobre o time, basta dizer que nosso primeiro e único chute a gol foi disparado aos 47 minutos do segundo tempo. Uma vergonha!
_Paulo Nobre: para quem torceu hoje o assessor de imprensa?
_Sobre o estádio, três breves considerações:
-Reafirmo a impressão: é muito feio.
-A acústica é ruim.
-Os banheiros são nojentos de tão limpos.