25 maio 2009

Mais uma do blogueiro anacrônico

Enquanto não sobra tempo para falar do promotor desocupado e dos nossos amigos do 2º BPChoque, deixo-os com um texto brilhante, mais um, do Seo Croce. É tão bom, atual e necessário que segue na íntegra. Até porque, se não fizermos isso os verdadeiros defensores do futebol, nossa extinção será abreviada além da conta.

MAIS UMA DO BLOGUEIRO ANACRÔNICO


Ontem a noite, ainda sob o efeito devastador de um empate sem cabimento, me coloquei a assistir o dossiê da Sportv, que tratava da ‘problemática’ das torcidas organizadas. Um documentário bem feito – com muita opinião vazia de gente que não frequenta estádio, é verdade – mas que apresentou alguns pontos relevantes no que se refere à violência e à decadente média de público nas arenas do Brasil afora.

Sobre essas questões, ouvi duas frases de Andrés Sanches que me chamaram a atenção e não me saem da cabeça; a primeira, porque revela uma lucidez que nenhum dirigente tem no Brasil. Questionado sobre o que achava das medidas do MP para conter a violência das organizadas, do estatuto do torcedor, Jecrim
nos estádios e quetais, o presidente alvinegro mandou essa, na lata:
"Acho que se os políticos tivessem a mesma preocupação com a sociedade em geral que demonstram com o futebol, este país seria uma maravilha…”

Afinal, amici, vocês já imaginaram que maravilha seria se existisse um tribunal de ‘tiro curto’ para cada senador bandido ou para cada deputado escroque que se esconde em castelos?… Ou se tivéssemos um legislativo que se dedicasse ao bem da sociedade e criasse mecanismos capazes de encarcerar juízes que vendem sentenças para o crime organizado? Ou se existisse um promotor vigilante para cada policial que mata uma criança, quando entra na favela atirando pra todo lado?

Já imaginaram, então, se houvesse um policial idôneo para cada promotor que mata alguém na rua, por motivos pessoais?… Então o Brasil seria, sem dúvida, um país mais justo.

Sanchez disse, em outras palavras, o que afirmamos neste e em outros espaços há algum tempo: os governantes do Brasil, a classe ‘dominante’ que impõe a lei e a ordem (através de normas e adendos que criam para seu próprio bem-estar), têm um preconceito injustificável em relação ao futebol. Porque essa paixão é coisa do povo, para o povo. E fazem de tudo para cercear qualquer manifestação de alegria espontânea desse povo, porque é sempre coisa que assusta e incomoda os puritanos da nação, em qualquer tempo, sob qualquer governo…

Percebam, amici, que tal fenômeno se dá em outras manifestações culturais de cunho popular – não é exclusividade do nosso futebol. Na música, por exemplo, o rap é taxado de música de bandido, o funk é visto como música de traficante, o pagode é considerado alienante como qualquer outra música pop que não tenha um conteúdo ‘cabeça’ que harmonize com os ouvidinhos cultos da classe média de uma nota só.

O carnaval, no Rio ou na Bahia, em Parintins ou em São Paulo, é mais excludente a cada ano que passa, mais controlado e vigiado pela polícia, com cada vez menos áreas de diversão para quem não pode bancar alto por tal divertimento.

E agora, quando devemos preparar nossa imagem para a Copa de 2014, é hora de tirar esse povão requenguela do estádio. É hora de afastar os jovens e a alegria espontânea, é hora de rechear as cadeiras numeradas com gente moderna, que não gosta de futebol no dia a dia, que tem até vergonha de falar no assunto entre amigos, no trabalho.

Porque essa gente é quem vai vender a imagem de um país em evolução, civilizado, pronto para o consumo em massa de produtos e serviços que fazem a alegria da massa alienada. Então o verdadeiro torcedor de futebol (o habitué dos estádios) atrapalha esse processo com seus modos rudes, e nada mais simplório que marginalizar as torcidas organizadas e tomá-las como bois de piranha, pois há pouca gente lúcida com disposição para defendê-las.

A segunda explanação do dirigente rival, no entanto, surpreendeu-me pela ingenuidade. Perguntado sobre como fazer para melhorar a vida de seu torcedor nas bilheterias, ele diz:

“Tenho hoje 25.000 Fiéis Torcedores
cadastrados, que podem comprar ingressos mais baratos . Isso vai gerar problemas lá na frente, eu sei: quando tiver 50.000 associados e só 40.000 lugares no estádio, o que vou fazer?

Os economistas dizem que a solução é aumentar os ingressos, regular a venda pela lei da oferta e da procura, mas eu não concordo. Acho que uma das únicas diversões do povo, senão a única, é o futebol. E o povão tem que ter direito de ir ao estádio torcer pelo seu time.”

Bom… concordo em gênero, número e grau com Sanches, eu e todo torcedor de arquibancada que conheço. Acontece que, um dia antes, na noite de sábado, a torcida rival protestava contra o aumento de seus ingressos (R$30,00) no Pacaembu. E um imbecil da diretoria de futebol do Corinthians, que atende pelo nome de Mário Gobbi, teve a pachorra de ir às câmeras dizer o seguinte, após o jogo:

“Tem que acabar com essa demagogia de falar que futebol é para o povo. Futebol não é mais para o povo, e faz tempo. O povo não pode nem pagar pela TV fechada, então o futebol não é mais popular.”

O repórter da Sportv faz, então, uma pergunta pertinente ao dirigente:
“Então o Corinthians não é mais o time do povo?”

Pego no contrapulo pela sagacidade do entrevistador, o corinthiano mais alinhado com essa Agenda Nacional de Elitização do Esporte me sai com essa pérola:
“É, mas esse povo tem que entender que o Corinthians tem dívidas.“

Confesso que senti pela do presidente corinthiano, tão cercado de gente que enxerga menos do que ele. Não há o que se fazer, amici: nem acolá, nem aqui. O processo de exclusão já está em curso nos estádios brasileiros, e não depende mais de um dirigente ou outro que deposite boa fé ou esparanças na comunhão com sua torcida.

A mim, resta apenas dizer que esse povo, se povo fosse, teria degolado Dualibis e Contursis há muito tempo, como já teria degolado no Rio de Janeiro presidentes que tanto endividaram clubes gigante, como Flamengo e Vasco da Gama. Esse povo não tem de responder, nem muito menos pagar a conta, por décadas de incompetência administrativa, de fisiologismo, de corrupção, de descaso com as coisas de seu clube por parte desses dirigentes.

Hoje as dívidas são monstruosas e os dirigentes não raramente são os mesmos, ou seus filhos, ou seus cupinchas. Para estes, a conta chegou alta e o governo federal fez a festa. Timemania, parcelamento de dívida-monstro do INSS, patrocínio de estatal na camisa, o diabo a quatro. A contrapartida é pura e simples, Andrés e demais dirigentes empenhados com seu torcedor: tirem essa gente pobre da nossa vista, porque não é esse o Brasil que queremos vender para fora, em hi-definition, durante a Copa de 2014.


***

SEGUNDA PELE

É Palmeiras. E é adidas. Indico o vídeo e a ação:

10 comentários:

Giovanna C. disse...

Nem panem nem circenses

Craudio disse...

Brilhante, o Seo Cruz!!!

Nicola disse...

Perfeito.

Seo Cruz disse...

eNQUANTO HOUVER O bARNESCHI POR AQUI, HÁ ESPERANÇAS... É SÓ O QUE DIGO, ALÉM DE AGRADECER A REFERÊNCIA.

Rodrigo Barneschi disse...

Tive o desprazer de assistir ontem a um debate sobre este assunto no Mesa Redonda. Não se poderia esperar coisa boa em se tratando dos debatedores, mas eu ouvi coisas mais absurdas do que o esperado.

Ouvi um Flavio Prado, aquele imbecil que defende que os torcedores não devem ir ao estádio, dizer alguns dos maiores impropérios já ditos na TV brasileira.

Coisas como "Precisa cobrar mais caro para trazer um público mais exigente e mudar o nível de quem freqüenta os estádios"

Nesse nível, meus caros.

Fora alguns imbecis, que vivem o futebol, e conseguiram dizer que R$ 40 era barato.

É o fim...

Ou não?

Giovanna C. disse...

Me diz quando que o Flavio Prado não fala bosta?
Do programas esportivos o único que eu ainda suporto é o Estádio 97, apesar de muitas vezes também pensar que meu ouvido não é pinico.
Melhor que ser surdo, convenhamos.

Rodrigo Barneschi disse...

Gi,

Eu gosto muito do Estádio. Ouço quase todos os dias, e encaro como um programa de humor. Eles são bons na arte de falar besteira. E são muito entrosados. O melhor de todos ali é o Mano.

Mas sabe qual é o questionamento que eu faço ao Estádio 97? Simples: eles não vão a estádios.
É estranho, mas é a mais pura verdade.

Beijos

Giovanna C. disse...

É vero. O Domênico tem um puta discursinho escroto para explicar pq não vai nem nunca mais irá ao estádio. Enfim, cada um com seu cada um, né?
A grande questão do Estádio 97, que usufrui desse nome sem poder, concordo, é que são humoristas fazendo palhaçadas. Já os outros são palhaços fazendo jornalismo.

Rodrigo Barneschi disse...

Sim, Gi, é bem por aí. E o Domenico não entende porra nenhuma de futebol. Nada, nada, nada. Mas ele não pensa saber mais do que sabe. Está lá pra falar besteira e tal. E todos os outros são assim. Mas é isso: eles não pensam ser o que não são.

Anderson Ugiette disse...

minha pergunta é : OBINA???

aaaaaaaaaaaaaaaaaa WTF???