25 abril 2013

O futebol, essa relíquia

1994. Dezembro. 8. O Brazil mundo perdia Tom Jobim.

Na noite daquele dia tão triste, uma constelação em verde e branco se reunia uma vez mais, uma das últimas, para representar 80 anos de uma história gloriosa. Surgiram no gramado da cancha municipal os craques alviverdes para enfrentar um à época perigosíssimo Guarani, dono da melhor campanha do Campeonato Brasileiro de 1994 até aquela noite. Era mata-mata. Semifinal. Ao Pacaembu se fizeram presentes 44.957 torcedores. 44.957!



Nem duas décadas se passaram. Não parece ser assim tanto tempo, mas fato é que o futebol involuiu mais nesse intervalo do que foi capaz de evoluir em todas as décadas anteriores.

Não se tem mais ninguém capaz de, como fez Evair, receber a bola com tamanha naturalidade, girar e mandá-la para a rede como se nada fosse. O Pacaembu já não pula mais como pulou naquele terceiro gol - até porque não havia grades a separar os 45 mil então acolhidos pelo estádio municipal. E as pessoas se faziam presentes, tomando conta de todos os espaços, mesmo aquelas 'baixadas' da arquibancada que hoje ficam vazias mesmo nos jogos com lotação máxima. Havia fumaça e bandeiras e a rede das metas, vejam vocês, ainda caía inclinada em direção ao gramado. Não se falava em Copa no Brazil, nem em Padrão Fifa, tampouco em arenas multiuso. Eram tempos em que cada um cumpria o seu papel: a torcida apoiava na arquibancada, os jogadores jogavam, os repórteres de campo eram... repórteres de campo (e não palhaços). Não se falava em cabelo de atleta, não havia espaço para fofoca, mesmo os tribunais desportivos, dirigentes e juristas vagabundos não se intrometiam tanto. E, claro, tínhamos um grande time. Eram tempos, enfim, em que o futebol era futebol.

Éramos felizes (não só os palmeirenses, mas todos os que amamos o futebol) e não sabíamos. Quer dizer: até sabíamos, mas não podíamos imaginar que aconteceria tudo o que veio depois.

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*Quando da publicação do texto sobre o Brasileiro/1994, mencionei que não era possível encontrar os gols deste jogo em lugar algum. Não era mesmo. Eis que o leitor Bruno Batera localizou esse material preciosíssimo. Meu muito obrigado a ele.

*Brazil é como o amigo Vitor, hoje expatriado em São José do Rio Preto, costuma se referir a este país. Ele tem razão: é Brazil mesmo. Um país que se presta à tamanha subserviência em relação à entidade que controla o futebol no mundo não pode mesmo ser levado a sério.

*Deixo aqui um pedido para o próximo capítulo da série "Turiassu, 1840": preciso de uma imagem (com boa qualidade) da torcida deixando o Palestra naquele trecho das alamedas bem abaixo da numerada coberta. Se a foto for do alto, a partir das numeradas ou da curva da arquibancada, melhor ainda. Alguém?

10 comentários:

Frederico disse...

É Barneschi, a construção de Arenas, a modernização do futebol é um caminho sem volta.

Não se vive mais hoje como se vivia nos anos 80.

Minha filha não brinca na rua como eu brincava, não tem a liberdade que eu tive quando criança. E o futebol não seria diferente. Morreu a inocência da humanidade.

Mas eu me pego parafraseando o Barneschi ao tentar voltar ao passado: "A camisa entra em campo, senhores..."

É essa camisa que me sustenta aqui.

Até nas Arenas, meus queridos, por infortúnio do destino, por baixo da tecnologia da Arena irá existir um pedaço do velho Palestra.

Arena Palestra será, no mundo moderno, quase como uma pirâmide do Gizé. Um pedaço de arquibancada por debaixo da estrutura nova, quem podia imaginar que a sacanagem dos políticos iam transformar essa arena em lenda?

Gregory disse...

Caro Barneschi, mto obrigado por textos como esse. Em 94 eu era mto novo e nao me lembro e muita coisa, e graças a voce pude me arrepiar vendo um momento tao lindo da historia alviverde. Obrigado!

Bruna disse...

Eu tenho 18 anos e infelizmente não vi e nem vivi nem 0,5% do futebol de verdade. Sofro muito por isso e cobro meu pai todos os dias por não ter nascido pelo menos uns 20 anos antes.. Eu seria uma pessoa mil vezes mais realizada.
Hoje sou obrigada a conviver com toda essa tecnologia e burocracia que acabam com a verdadeira magia do futebol.
Estou sempre comprando livros e procurando arquivos na internet pra tentar sentir um pouco disso, e claro deixo tudo muito bem guardado para os meus futuros filhos. Tenho até medo de imaginar como vai estar o futebol daqui 10 ou 15 anos.
Triste realidade.
E como de costume, mais um belíssimo texto!

Unknown disse...

Barneschi,toda vez que vejo esses textos "saudosistas" fico cada vez mais puto com esse futebol de merda de hj em dia,sobretudo qndo vejo torcedores do Palmeiras se vangloriando de termos uma "Arena" com um "Naming Right"(meu Deus!!).


Leonardo disse...

Não vivi esse período e tenho pouquíssimas lembranças do Palmeiras na década de 90 e, vendo vídeos como este, dá uma vontade tremenda de viver dias como esse.

Meu pai me conta histórias muito interessante de como era ser palmeirense nas décadas de 80 e 90. De como foi difícil entrar no Morumbi na final do Paulista conta a Inter de Limeira, de brigas contra rivais ali mesmo embaixo das arquibancadas ou de como a torcida do Palmeiras fazia festas espetaculares. Nas palavras dele vejo que era um tempo muito melhor.

Hoje meu pai é até mais presente como torcedor do que décadas atrás - e tornou a mim e a meu irmão torcedores tão fanáticos quanto ele - mas tudo parece ser proibido e o futebol perde um pouco da sua essência a cada dia.

Leonardo Nakamura

Leonardo disse...

PS: a batalha para um dos ingressos para o jogo na Vila parece perdida. Parabéns aos responsáveis por 600 ingressos em um clássico pelo mata-mata do Paulista.

Que tempos vivemos.

Leonardo Nakamura

Sandro - Salvador/BA disse...

Rodrigo,

Mais importante que esse jogo, para mim, foi o do ano anterior contra o mesmo Guarani, porém em Campinas. Graças a uma atuação magistral de Sorato e dois gols de Zinho. Ali selamos o caminho para pegar o Campeonato Brasileiro de 1993.
Jogo épico.

Sandro

César SEP disse...

Pra galera se recordar:

http://www.youtube.com/watch?v=qlwMv6f9u3A

3x0 em cima da galinhas, no Parque Antártica...

Abs

Auricchio disse...

Eu estava no Paulo Machado neste dia, como fui estar também na semana e nos final de semana seguintes contras os gambás. Tínhamos uma seleção que se odiava fora de campo, mas dentro dele que delícia. Pena que NUNCA mais veremos times como aqueles.....

DiegoBMX disse...

http://asmilcamisas.wordpress.com/2010/03/26/dario-dubois-black-metal-futebol/ recomendo esse link.