27 março 2012

Mineirão, 30.05.2001

O jogo que valeu ao Palmeiras a classificação para a semifinal da Libertadores pelo terceiro ano seguido (1999, 2000 e 2001) é menos lembrado do que deveria. Provavelmente porque eclipsado pela eliminação em casa contra o Boca na fase seguinte, outro tanto porque disputado longe de nossos domínios, talvez até mesmo porque aquele time não era assim dos mais memoráveis. Mas foi um jogo e tanto, repleto de detalhes que só ganharam ainda mais relevância com o passar dos anos. Vejamos:

A partida aconteceu em um 30 de maio, exatos três anos depois de termos batido o Cruzeiro na final da Copa do Brasil. Cruzeiro este que, diga-se de passagem, foi um adversário dos mais insuportáveis desde a segunda metade da década de 1990. A data do jogo decisivo (30 de maio) era sintomática do que estava por vir. Querem mais? Lembro então que o técnico do outro lado era logo Luiz Felipe Scolari, o homem que nos levou à conquista da América dois anos antes e que havia deixado o clube no anterior. No nosso banco, um técnico dos mais contestados, Celso Roth, uma tentativa pouco inspirada de substituir Felipão.

Aquele Palmeiras começou o ano desacreditado. Eliminado da Copa João Havelange de 2000 pelo São Caetano e tendo perdido para o Vasco a final da Copa Mercosul naquela incrível virada no Palestra, o time fracassou de maneira retumbante no Rio-SP e capengou também no Paulistão, escapando do rebaixamento apenas algumas rodadas antes do final. Descontente com o desempenho de Marco Aurélio, a diretoria alviverde o demitiu e trouxe Roth no começo de março. Ele foi ajeitando o time aos poucos e o Palmeiras cumpriu uma campanha invejável na fase de grupos da Libertadores: cinco vitórias e um empate, tendo como adversários Cerro Porteño/PAR, Universidad de Chile/CHI e Sport Boys/PER.

Nas oitavas, veio o São Caetano, forte à época – vice-campeão nacional em 2000, repetiria a dose em 2001. Primeiro jogo, no ABC, em uma quarta-feira fria: derrota por 1 a 0. Na volta, no Palestra completamente tomado, uma ‘noite felipônica’: vitória por 1 a 0, gol do talismã Muñoz já nos minutos finais, e vaga garantida nos pênaltis: 5 a 3, com 100% de aproveitamento do nosso lado e um chute para fora do time do ABC.

Foi aí que surgiu o Cruzeiro no nosso caminho. Não apenas Felipão estava do outro lado, mas também Oséas, herói dos títulos de 1998 e 1999, era o centroavante dos caras. Para completar, outros três jogadores com passagem pelo alviverde no ano anterior tinham seguido junto com o antigo treinador: Neném, Jackson e Marcelo Ramos. Suspenso, Scolari não pôde dirigir o clube mineiro no jogo da volta, em BH. Melhor para o Palmeiras.

2001, peço que lembrem, foi aquele ano do apagão e do racionamento de energia. Partidas noturnas foram proibidas pelo Governo, e o palmeirense se acostumou a ir ao estádio no bizarro horário das 14h45 (inclusive no meio de semana). Ciente da necessidade de contar com o Palestra cheio (e com a torcida habitual), a direção do Palmeiras alugou um gerador, de tal forma que o jogo pôde acontecer à noite (não no horário desejado, mas às 19h30, por exigência da emissora de TV, a extinta PSN).

Casa cheia, mais de 30 mil pagantes, confusão na entrada, jogo tenso. Lopes, o Tigrão, abriu o placar aos 17’ do primeiro tempo. Mas aí o juiz resolveu aprontar: expulsou Magrão aos 34’. Foi o bastante para que o Cruzeiro avançasse e chegasse à virada: Oséas (40’) e Geovanni (43’), este em evidente posição de impedimento, silenciaram o Palestra. Com um a menos, a reação parecia improvável. Mas Lopes, de novo, empatou aos 17’ do segundo tempo. O 2 a 2 parecia o resultado final, até que Jorge Wagner, aos 35’, colocou os mineiros mais uma vez em vantagem. O Palestra veio abaixo quando, já nos descontos, Lopes acertou um chute indefensável de fora da área e decretou o empate em 3 a 3.

Igualdade em casa por três gols não é bom resultado em lugar algum, mas, se serve de consolo, o regulamento daquele ano ainda não fazia referência ao critério do gol marcado fora de casa. Ou seja: novo empate no Mineirão levaria a disputa para os pênaltis. Apostando nisso, quase 20 ônibus com torcedores organizados deixaram a capital paulista na madrugada de 30 de maio de 2001 em direção à capital mineira. Foram 12 longas horas de viagem, muito sufoco, histórias para toda a vida. Coisas que só uma caravana de torcida organizada proporciona.

Chegamos ao Mineirão bem cedo, ainda com o dia claro, e a PM local logo tratou de nos colocar para dentro, na geral atrás de um dos gols. Todos com fome, um dia inteiro sem comer, e o que nos esperava lá dentro não podia ser melhor: o incomparável “tropeiro do Mineirão”. Hoje extinto (coisas do futebol moderno...), o prato vinha com arroz, feijão, calabresa, ovo, bacon e farinha de mandioca, tudo muito bem temperado. O marmitex que alimentava uma pessoa custava módicos R$ 3. Não podia haver nada melhor para aquele bando de pouco mais de mil torcedores.

Alimentados, restavam ainda umas quatro horas para o encontro decisivo. Alguns dormiam no cimento da geral, outros ficavam arrumando as faixas, uns percorriam as alamedas do Mineirão à espera de algum confronto, por menor que fosse. Os quase 70 mil torcedores da casa começaram a chegar por volta de 19h. Do nosso lado, um bom público: quase quatro mil pessoas, boa parte de atleticanos que chegavam de todos os lados para empurrar o Palmeiras.

Eis aqui nossos representantes em campo: Marcos; Arce, Leonardo, Alexandre e Felipe; Fernando, Galeano, Alex e Lopes; Juninho (Basílio) e Fábio Jr. (Tuta) (Muñoz). O Cruzeiro tinha mais time. E tinha mais técnico. Mas só o Palmeiras é Palestra.

Primeiro tempo, 5 minutos: bola cruzada para a área e Alessandro, aquele do Santos, abre o placar de cabeça. O Palmeiras não se abate, segue lutando e tem um pênalti marcado em jogada de Alex logo a seguir. O camisa 10 vai para a bola. Trave. O Cruzeiro segue em vantagem, e vamos assim para o intervalo. O empate veio aos 8’ do segundo tempo: a cobrança de falta de Arce cruza toda a grande área e vai morrer na rede do goleiro André. Pouco depois é a vez de o zagueiro Cris colocar o time da casa novamente em vantagem. Mas nós tínhamos Arce na lateral-direita. Falta aos 40’ da etapa final. O paraguaio levanta para a área, Alexandre sobe mais que a zaga do Cruzeiro e cabeceia na diagonal. André não alcança. Gol! A decisão vai para os pênaltis.

Vieram os pênaltis, de novo eles. E aí nós tínhamos São Marcos, que pegou três cobranças em uma série das mais emocionantes:


Das muitas imagens que eu guardo daquela noite histórica longe de casa, fico com a da nossa saída do Mineirão, quase uma hora depois do jogo. Os torcedores locais nos esperavam no estacionamento em frente, dispostos a brigar. Mas éramos tantos, e estávamos tão embriagados pelo doce sabor da vitória, que eles apenas ficaram olhando, à espreita, enquanto a multidão verde caminhava em direção aos ônibus com bandeiras tremulando e instrumentos acima da cabeça. Ali era Palmeiras. Um jogo para sempre...

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Palmeiras 3-3 Cruzeiro, os 90 minutos:

Cruzeiro 2(3)-2(4) Palmeiras, 90 minutos + pênaltis:


Matéria pós-jogo de volta:

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*Texto meu publicado originalmente lá no Verdazzo.

8 comentários:

André / Americana disse...

Me lembro desse jogo...indo pro PETAR, lá na divisa com o Paraná, um parque com um monte de caverna. Uma bosta de lugar, viagem por livre e espontânea pressão. E fui ouvindo o jogo no busão, todo mundo dormindo e eu torcendo solitário. E gritando feito um louco com o gol de empate que levou aos pênaltis.

Pedro Pellegrino disse...

Magnífico texto,Barneschi! Caspita, nem lembrava que o Oséas jogou pelo Cruzeiro contra nós! Aliás, nem lembro como terminou a carreira do goleador. " Foram 12 longas horas de viagem, muito sufoco, histórias para toda a vida.", conta no livro depois! Esse jogo foi foda, puta vitória! Lembro do meu pai dizendo:" É,Felipão, acha que esse Cruzeiro é o Palmeiras, que você vai ganhar assim fácil de nós?! Antes de você, nós já tínhamos uma história..." algo assim,rs. Grande abraço.

Pedro Pellegrino disse...

Tava comentando esses dias sobre essa PSN, deu origem a Fox Sports, ou nada a ver?

AMAURY disse...

o buso que eu tava,parou pra ajudar um buso quebrado...chegamos em betim a escolta ja tinha saido com os outros,andamos por BH perdidos,ja tava dando 18hs,eles ja saiam dos trampos e se preparavam pra ir ja pro estadio...paramos no mercado jumbo,no centro de BH,eu desci pra perguntar pro segurança kkkk 2 busos e apenas 1 doze por um guardado pra se caso desse encontro...o tal guardinha,tava mais perdido q a gente...até que eu vi no farol um carro da CET,pedi pra eles levarem a gente pro mineirão...pra nossa sorte eles eram galo levaram gente,mas tiveram a genial ideia de passar com os 2 busos pelo portão principal,aonde ja tinham uns marias...se armamo pra descer pq eles vieram pra cima do busos,ma a PM local segurou e nem deu nada,chegamo na bancada eram quase 19hs kkk

Bruno disse...

no texto vc fala q o alex foi substituído pelo Muñoz, e dps o alex aparece nas cobranças de penais
não entendi...

Rodrigo Barneschi disse...

Bruno,
Tem razão. A substituição não foi essa. Vou conferir nos meus arquivos em casa e depois corrijo. Valeu.

Rodrigo Barneschi disse...

Bruno,
Me confundi com uma informação nas minhas anotações. Obrigação pela sua observação. Agora corrigi. O Muñoz entrou no lugar do Tuta, que, por sua vez, tinha entrado no lugar do Fábio Jr.

Diego Marques disse...

Esse jogo foi histórico, lembro até hoje tudo contra nóis, gol no começo, penalti perdido.O Alexandre empato quase no final, depois os penalti foi de mata.